Bowling Green, Ohio – A contratação de Eddie George para comandar o programa de futebol americano da Bowling Green State University reforça uma tendência recente no esporte universitário: escolas recorrerem a nomes consagrados da NFL, mas com currículo reduzido como treinadores, para turbinar visibilidade, arrecadação e, esperançosamente, resultados em campo.
George, vencedor do Heisman em 1995 por Ohio State e ex-running back com carreira destacada na liga profissional, torna-se o primeiro detentor do troféu a chefiar um time da Football Bowl Subdivision (FBS) desde Steve Spurrier. Ele chega após quatro temporadas em Tennessee State, onde revitalizou a equipe, conquistou vaga nos playoffs da Football Championship Subdivision (FCS) em 2024 e foi eleito técnico do ano na conferência.
O movimento tem como principal catalisador o impacto gerado por Deion “Coach Prime” Sanders. Desde 2020, Sanders acumulou êxitos em Jackson State, alavancou o recrutamento, migrou para Colorado e conduziu Travis Hunter ao Heisman, aumentando o apetite de outras universidades por perfis semelhantes. Em 2025, a lista de apostas inclui Bill Belichick na Carolina do Norte, Michael Vick em Norfolk State e DeSean Jackson em Delaware State; além de negociações recentes envolvendo Ray Lewis e Ed Reed.
A estratégia mira retorno rápido. Em Bowling Green, a nomeação de George gerou segundo a instituição mais de 4 bilhões de interações nas redes sociais e impulsionou as vendas de ingressos em 157% na comparação anual. Os perfis oficiais do departamento esportivo já superavam em julho toda a movimentação digital registrada no ciclo anterior.
Contudo, a fama não substitui a rotina exigente de um treinador universitário: seleção de atletas, jantares com doadores, viagens longas e orçamentos apertados. O salário anual de George, de US$ 600 mil, ilustra a diferença em relação aos vencimentos que muitos desses ex-atletas receberam na NFL. Em instituições menores, como Norfolk State (orçamento de US$ 21 milhões em 2024) e Delaware State (US$ 16 milhões), o descompasso entre notoriedade do técnico e recursos disponíveis pode ser ainda maior.
Casos recentes mostram que o retorno esportivo não é automático. Trent Dilfer, campeão do Super Bowl e hoje em UAB, soma 7-17 em dois anos. Já Sanders, embora concentre grande atenção midiática, acumula apenas uma vitória contra adversários ranqueados em Colorado. Belichick, seis vezes campeão da NFL, recebeu salário superior ao do ex-técnico Mack Brown e garantias de investimento mínimo de US$ 13 milhões em receitas para aquisição de jogadores, mas enfrentou cobertura fora de campo que ofuscou a preparação da equipe.
O plano de George
George afirma que sua reputação abre portas, mas não sustenta um programa: “A celebridade atrai, porém o elenco quer saber como será desenvolvido”. Para explicar suas exigências, ele utiliza a sigla G.U.T.S. – coragem, compreensão, tenacidade e sacrifício. Entre os primeiros atos em Bowling Green, aplicou flexões a si mesmo por atrasar-se quinze minutos em um jantar com a linha ofensiva e convocou exercícios sob o sol de julho quando encontrou o vestiário desorganizado.

Imagem: espn.com
A preparação de George para o cargo começou de forma inusitada. Ainda em 2021, recusou inicialmente o convite de Tennessee State porque se dedicava à atuação em teatro e a uma empresa de serviços financeiros. Depois de duas semanas de reflexão, decidiu aceitar com a condição de que a universidade investisse em estrutura. O retorno veio rapidamente: além de resultados esportivos, conseguiu ampliar doações e atrair patrocinadores.
A experiência reforçou a convicção de que habilidades fora do campo – gestão, comunicação e mesmo atuação nos palcos – podem ser aplicadas ao ambiente universitário. George descreve o time como “uma empresa da Fortune 500” na qual cada detalhe precisa refletir excelência, desde uniformes até a rotina acadêmica dos atletas.
Desafios e expectativas
Apesar da empolgação inicial, a sustentabilidade dessa abordagem segue em debate. Especialistas lembram que técnicos que subiram pela via tradicional passaram anos como auxiliares, conciliando baixos salários e longas jornadas antes de chegarem ao posto principal. Para eles, a entrada direta de celebridades pode ignorar etapas essenciais de formação.
George reconhece a crítica, mas argumenta que vivenciou o esporte em múltiplas dimensões – jogador, comentarista, empreendedor – o que, segundo ele, equivale a começar “de cima para baixo”. Na prática, aposta na relação próxima com o elenco. O cornerback Jalen McClendon, por exemplo, recusou ofertas financeiras maiores em outras universidades para acompanhar o treinador de Tennessee State a Bowling Green, alegando confiança no projeto.
No curto prazo, o sucesso dessas contratações será medido pelo desempenho em campo. No longo prazo, universidades avaliam que a projeção nacional, o aumento de receitas e o engajamento dos torcedores justificam o risco. Enquanto isso, George reforça que seu passado garante apenas a porta de entrada: “Não posso viver das conquistas anteriores; o trabalho começa quando entro no vestiário”.