O Palmeiras atravessa um período de tensão com parte de sua torcida, situação que contrasta com o desempenho esportivo da equipe. Entre maio e junho de 2024, o clube registrou episódios como xingamentos ao técnico Abel Ferreira, ataque com explosivos ao Centro de Treinamento na véspera de uma rodada do Campeonato Brasileiro e vaias repetidas no Allianz Parque desde a eliminação para o Corinthians na Copa do Brasil.
Em campo, o cenário é inverso ao ambiente de protestos. O time ocupa a terceira colocação do Brasileirão, com a segunda melhor média de pontos, e chega às oitavas de final da Copa Libertadores como o único a concluir a fase de grupos com 100% de aproveitamento. O contraste entre resultados e insatisfação expôs um desgaste que não era percebido desde o início da sequência de títulos iniciada em 2015.
A eliminação diante do Corinthians, em maio, desfez um período de quase cinco anos de harmonia entre arquibancada e comissão técnica. O revés foi sucedido por outras decepções recentes, como a queda para o Chelsea nas quartas de final da Copa do Mundo de Clubes e o vice-campeonato paulista, também para o Corinthians, em março. Esses episódios alimentaram um clima de cobrança que se estende além dos resultados imediatos.
Desde a reconquista da Copa do Brasil de 2015, o Palmeiras acumulou troféus em quase todas as temporadas — exceções apenas em 2017 e 2019. O crescimento foi sustentado por investimentos e pela chegada de Abel Ferreira, em 2020, que ampliou a lista de conquistas. Porém, a administração da relação com o torcedor não avançou na mesma proporção, segundo profissionais do mercado que analisam o modelo de negócios alviverde.
O clube estruturou seu fluxo de receitas em três pilares: formação e venda de atletas, premiações por desempenho em campeonatos e receitas de bilheteria e programa de sócio-torcedor. A presença constante em finais aumentou os ganhos dessas frentes, mas deixou a maior parte da arrecadação atrelada ao resultado esportivo. Projetos de engajamento, licenciamento e experiências foram menos explorados no período.
Exemplo desse cenário é o Palmeiras Pay, lançado em 2023. O produto financeiro alcançou adesão relevante, impulsionada por benefícios conectados ao Avanti, programa de associação que facilita o acesso a ingressos no Allianz Parque. Embora positivo, o desempenho reforça a dependência de vantagens ligadas diretamente ao jogo, em vez de iniciativas que promovam consumo de serviços ou conteúdos fora do dia da partida.

Imagem: maquinadoesporte.com.br
Dados internos indicam que, mesmo com o maior ciclo de vitórias da história do clube, a comercialização de produtos licenciados cresceu abaixo do esperado. Itens como camisas, acessórios e memorabilia não acompanharam a expansão média de faturamento observada nos demais pilares. Consultores atribuem o resultado à ausência de campanhas continuadas de marketing, storytelling e lançamentos que explorem o patrimônio histórico e cultural do Palmeiras.
O risco identificado por especialistas é a crescente insatisfação virar padrão quando os resultados não corresponderem às expectativas. A depender quase exclusivamente da performance em campo para sustentar receita e satisfação, o clube fica vulnerável a oscilações comuns no futebol. Quando a hegemonia é interrompida, a frustração tende a ser proporcional à falta de alternativas para o torcedor se envolver.
Em meio ao atual atrito, a diretoria avalia medidas de segurança e diálogo com organizadas, mas ainda não apresentou um plano público voltado a experiências, conteúdos ou novos produtos. Enquanto isso, o time segue a preparação para a próxima rodada do Brasileirão e observa o sorteio das oitavas da Libertadores. A sequência de jogos decisivos pode aliviar a tensão se as vitórias se mantiverem, mas o debate sobre a necessidade de ampliar a conexão com a torcida permanece no centro das discussões internas.